Ontem (06), o Ministério Público Estadual (MPE) pediu pelo indeferimento do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários, requerendo que seja certificado nos autos de todos os processos  individuais de pedido de registro dos candidatos a ele vinculados para os fins do artigo 47 e 48 da Resolução n.º 23.609/2019. 

O Partido Podemos deixou de atender o quanto previsto no art. 6º, §5º, da Resolução mencionada, que nos diz: 

§ 5º Até o dia seguinte ao da realização da convenção, o arquivo da ata gerado pelo CANDex deverá ser transmitido via internet ou, na impossibilidade, ser gravado em mídia a ser entregue na Justiça Eleitoral (Lei nº 9.504/1997, art. 8º).

 

Segundo o MPE, no caso concreto, considerando que a Convenção Partidária ocorreu na data de 15/09/2020 (terça-feira) e fora transmitida em 17/09/2020 (quinta-feira) à Justiça Eleitoral, constatou-se que não fora obedecido o prazo de 24h para tanto. 

Segundo o Blog Eleitoralista, especialista em Direito Eleitoral, a resolução do TSE que trata do registro das candidaturas trouxe uma novidade – dentre tantos outros penduricalhos administrativos– que vem causando polêmica nos registros de candidatura: a obrigação de depositar em cartório, em 24 horas, as atas das convenções realizadas pelos partidos (art. 8º, § 1º da Res. 23.445). Apesar de ser norma penal em branco – isto é, não prever penalidade – não foram poucas as impugnações ofertadas, até mesmo pelo Ministério Público,por conta de alegados descumprimentos da norma afirmando nulidade das convenções e indeferimento dos DRAPs.

Apesar de nos parecer pouco factível impedir candidaturas por tal motivo, é necessário que se fixem alguns pressupostos básicos da inaplicabilidade da pretensão invalidar convenções, negar DRAP ou candidaturas pelo descumprimento de tal norma, senão vejamos:

A disposição foi inserida na resolução, para que as atas fossem arquivadas em cartório, evitando alterações posteriores, efetivadas pelos partidos e coligações entre a data das convenções e o registro das candidaturas;

A disposição de apresentação das atas no cartório eleitoral em 24 horas não deriva da lei, já que o art. 8º da LE, com a alteração da Lei 13.165, assim não prevê e, sendo norma administrativa, não pode imputar pena de indeferimento de DRAP e das candidaturas, sem previsão legal;

 

Todas as normas administrativas do art. 8º da LE são passíveis de correção, se sanadas tempestivamente, e podem ser objeto, até mesmo de diligência, se não cumpridas ordinariamente, consoante reiterada jurisprudência dos tribunais.

A doutrina de José Jairo Gomes[1], já atualizada com as alterações da Lei 13.165, assim estabelece:

“a atividade da convenção deve ser registrada em ata, lavrada em livro previamente aberto e rubricado pela justiça eleitoral, devendo tal ata ser publicada em 24 horas em qualquer meio de comunicação. Alguns autores – como Serejo – reputam essa exigência ofensiva à autonomia partidária, já que a vigente LOPP não a prevê… “Todavia, o controle da justiça eleitoral (mediante o depósito das atas) é eminentemente preventivo, e visa conferir segurança e confiabilidade a esse importante ato, de sorte a prevenir futuras disputas acerca das deliberações oficialmente tomadas pelos convencionais”.

Assim, também a de Rodrigo López Zilio[2]:

“A lei 12.891/13 também estabeleceu a necessidade de publicação em 24 horas ‘em qualquer meio de comunicação’ (art. 8ª caput da LE) da ata que lavrar o resultado da convecção em livro aberto. …A regra tem o objetivo de facilitar a fiscalização e conferir transparência aos atos partidário que tem reflexo no processo eleitoral. ..EMBORA NÃO EXISTA SANÇÃO PARA O DESCUMPRIMENTO DA NORMA, os prejudicados podem exigir a observância desse comando normativo, sob pena de desobediência.

Como se vê, a norma não é pressuposto da validade das convenções e muito menos do DRAP da coligação, mas sim, atinente à preservação dos direitos dos próprios candidatos escolhidos em convenção e partidos coligados – visando a preservação das escolhas no momento próprio e, portanto, a eles de dirige a norma.

Neste aspecto, como em todos os outros dispositivos acessórios do art. 8º – a exemplo da lavratura da ata em livro rubricado pela justiça eleitoral – quando demonstrado a regularidade dos atos partidários, não se evidenciado nenhum indício de grave irregularidade ou fraude, os atos são convalidados, consoante a jurisprudência do TSE[3] (AgR-REspe nº 8942, rel. Min. Arnaldo Versiani).

Destarte, a norma se dirige à proteção dos candidatos e partidos integrantes da coligação– já que outros, fora da coligação não teminteresse ou legitimidade para tal discussão. Assim, ressoaria evidente contrassenso que norma dirigida à proteção dos candidatos e partidos coligados redundasse em indeferimento dos DRAPS e de seus requerimentos de registro, caso descumprida.

Por tal principiologia, mesmo que a norma não venha a se cumprir no rigorismo ali determinado, demonstrado a regularidade dos atos, não geraria qualquer consequência para os partidos, candidatos, coligação e,com muito mais razão, para o deferimento do DRAP.

Assim, mesmo que se admitisse a extemporaneidade do protocolo da ata em 24 horas, o fato não teria qualquer repercussão na validade da convenção, nem tampouco para o registro das candidaturas, já que a lei não prevê tal sanção.

Para fins do registro, a lei prevê outra oportunidade para juntada da ata (art. 25 da Res. 23.455) devidamente assinada, digitalizada e acompanhada das respectivas assinaturas, aí si, exigindo-se formalmente o documento,sob pena de indeferimento:

Art. 25. A via impressa do formulário DRAP deve ser assinada nos termos do art. 23 e entregue ao Juízo Eleitoral competente, no momento do pedido de registro, com a cópia da ata da convenção, digitada, assinada e acompanhada da lista de presença dos convencionais com as respectivas assinaturas (Lei nº 9.504/1997, arts. 8º, caput, e art. 11, § 1°, inciso I).

Mas mesmo neste momento, caso haja alguma impropriedade, abre-se prazo para sanar diligência. Ora, se neste momento crucial do registro se admite a sanação de eventual omissão, não seria lógico que naquele momento se impedisse a possibilidade de sanar, de se corrigir o ato.

Assim, a omissão do depósito das atas em 24 horas – é lógico e sistêmico – poderia, no máximo, resultar em diligência do cartório para ser sanada, jamais nulidade da convenção ou indeferimento do DRAP.

A restrição a direitos fundamentais deve atender aos parâmetros de adequação entre meios e fins, necessidade da restrição (exigibilidade) e proporcionalidade em sentido estrito. Na célebre síntese de Georg Jellinek, significa que “não se abatem pardais com tiros de canhão”. Dessa forma, a hermenêutica, consoante HESSE, estabelece que “o intérprete deve afastar interpretações desequilibradas, e deve interpretar as restrições aos direitos fundamentais sempre de maneira a restringi-los o mínimo possível”.[4]

Ora, já se delineou que o princípio constitucional é o da ELEGIBILIDADE (erigido à condição de direito fundamental), não se admitindo como válida qualquer interpretação que extraia da norma um sentido que restrinja direitos de forma tão severa, que chega ao ponto de pretender impedir candidaturas por ato administrativo, sanável, que a própria Lei não previu tal consequência (cf. art. 8º, LE).

Tal princípio está materializado nos termos do art. 219 do CEL, segundo o qual na aplicação da lei eleitoral o juiz atenderá sempre aos fins e resultados a que ela se dirige, abstendo-se de pronunciar nulidades sem demonstração de prejuízo.

Art. 219. Na aplicação da lei eleitoral o juiz atenderá sempre aos fins e resultados a que ela se dirige, abstendo-se de pronunciar nulidades sem demonstração de prejuízo.

Em claras linhas, se a ata foi depositada, permitindo a publicação, pouco importa se praticado após as 12, 24 ou 48 horas. É omissão que não causa indeferimento ou nulidade, da ata, da convenção ou mesmo do DRAP.

Observe, por fim, que a pretensão chega a ser tão esdruxula, que se passou a exigir a apresentação da ata em 24 horas do início da convenção.

Ora a norma só pode determinar o envio das atas 24 horas após o fim da convenção, já que é nesta hora que estas são lavradas. Por tal motivo, a Resolução fala em enviar a ata em 24 horas “após a convenção”:

Art. 8º … § 1º A ata da convenção, digitada e assinada em duas vias, será encaminhada ao Juízo Eleitoral, em vinte e quatro horas após a convenção, para:

I – publicação em cartório (art. 8º da Lei nº 9.504/1997);

Como as atas, em geral, não determinamo horário de sua lavratura, ou do fim da convenção, a interpretação lógica seria a fixação do dies a quo no fim do dia da convenção, e não do início da convenção, como quis em determinado município o MPE.

E assim, em geral, as 24 horas se encerrariam em horário posterior ao do funcionamento cartorário, o que, pela lógica, protrairia o horário do protocolo para a primeira hora do dia seguinte.

A finalidade da norma, assim, é evitar alterações das atas entre a sua feitura e a apresentação do DRAP. Assim, ainda que o protocolo ultrapassasse algumas horas do comando estabelecido, a finalidade da norma resta atendida se publicada na sequencia imediata após a convenção – primeira hora do dia subsequente ao prazo. Garantida a preservação de seu conteúdo, na sequencia da convenção, ainda que não se observa a imediatidade do prazo de 24 horas, o ato é válido, não acarretaria nulidade da convenção, do DRAP ou mesmo dos Registros dos candidatos.

Mas, cai entre nós o Podemos de Ilhéus com vários advogados dando um mole desse né? Aprendam Advogados trabalham COM PRAZOS. 

Fundamentação do Blog eleitoralistas

IMPUGNAÇÃO DRAP PODEMOS

[1] Gomes, José Jairo. In Direito Eleitoral. Ed. Atlas, 12ª ed. 2016. P. 327

[2]Zilio, Rodrigues Lópes, in Direito Eleitoral, Ed. Verbo Jurídico, 5ª ed. 2016, p. 294

[3]“Registro de candidaturas. Ata de convenção. – Embora o art. 8º da Lei nº 9.504/97 estabeleça a exigência de que a lavratura de ata de convenção ocorra em livro aberto e rubricado pela Justiça Eleitoral, É POSSÍVEL O DEFERIMENTO DO DEMONSTRATIVO DE REGULARIDADE DE ATOS PARTIDÁRIOS SE NÃO FOR EVIDENCIADO NENHUM INDÍCIO DE GRAVE IRREGULARIDADE OU FRAUDE NO CASO CONCRETO, o que foi corroborado pela ausência de impugnação pelas legendas ou candidatos que integram a coligação ou mesmo por convencionais não escolhidos para a disputa […]” (TSE – Ac. de 11.9.2012 no AgR-REspe nº 8942, rel. Min. Arnaldo Versiani. )

[4]O princípio da proporcionalidade desdobra-se em três aspectos fundamentais: adequação, cujo significado consiste na idéia de que o intérprete deve identificar o meio adequado para a consecução dos objetivos pretendidos; necessidade (ou exigibilidade), que significa que o meio escolhido não deve exceder os limites indispensáveis à conservação dos fins desejados; e, por fim, a proporcionalidade em sentido estrito, que determina que o meio escolhido, no caso específico, deve se mostrar como o mais vantajoso para a promoção do conjunto de valores em jogo.

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