O Fórum de Irecê, no Centro-Norte baiano, foi um dos 62 que integram o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) que receberam processos remanescentes das 74 comarcas desativadas no estado em cinco anos. Segundo o TJ-BA, entre 2012 e 2017, 25% das comarcas foram fechadas, e as demandas, encaminhadas às cidades-sede mais próximas. A Bahia conta, atualmente, com 203 comarcas ativas, sendo que, em 2012, eram 277 em funcionamento no estado.

Iara Araújo Barreto dos Santos é servidora da 1ª Vara Cível desde 2004 e acompanhou todo o processo de desativação nos últimos cinco anos. Irecê foi a que mais recebeu processos, já que se transformou em agregadora das comarcas de Ibititá, Jussara, Presidente Dutra e São Gabriel, unidades que não existem mais.

“Quando as quatro comarcas foram desativadas e os processos chegaram até Irecê, alguns servidores vieram junto. Mas isso não foi suficiente para reduzir a demanda e o trabalho por aqui. Essa é a maior crítica dos advogados e das partes: o tempo de retorno da comarca. Não dá para atender 100% com frequência, e o serviço, mesmo tendo melhorado desde que comecei a trabalhar, ainda deixa muito a desejar”, disse a servidora.

O Tribunal de Justiça da Bahia afirmou que os critérios para a desativação de comarcas não são definidos pelo órgão, mas, sim, por uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). É necessário observar alguns elementos, “como presença ou não de juiz titular, distância para possível comarca agregadora, viabilidade de remoção dos servidores e outros”. Ainda segundo o TJ-BA, “as comarcas agregadoras devem ser próximas geograficamente das desativadas, o que garante que nenhum município fique sem acesso ao Poder Judiciário”.

Informatização da Justiça

Como consequência da desativação de comarcas e para reduzir custos, foi criado um sistema eletrônico de acesso à Justiça – o e-SAJ, em 2013. “A Justiça está aberta para todos e está cada vez mais fácil ter acesso a ela, mesmo sem sair de casa. O e-SAJ e o PJe, implantado na Bahia em 2014, oferecem serviços de peticionamento, acompanhamento processual, consulta de pauta de audiência, conferência de documentação, além de outros que podem ser usufruídos por toda a população”, ressaltou o órgão.

A servidora da 1ª Vara Cível de Irecê disse que a informatização foi positiva. “Se não fosse isso, o impacto do fechamento de comarcas teria sido muito maior”, declarou.

Há três anos, mais de 26 comarcas do interior do estado passaram a integrar o Sistema de Peticionamento Judicial Eletrônico (PJe). Foi o caso de Dias D’Ávila, que, até então, necessitava da presença física de advogados e partes para que qualquer ato judicial pudesse ser reconhecido.

O advogado de Salvador João Guilherme Monteiro contou ao CORREIO que, em 2014, foi chamado para fazer parte de um caso de inventário que tramitava justamente no município da região metropolitana. “Estava-recém formado e minha cliente já tinha advogado constituído, mas era no Rio de Janeiro, onde ela morava. Fui convidado a representá-la junto à comarca de Dias D’Ávila, onde o processo estava. Foram muitas viagens (Salvador – Dias D’Ávila) e, por não existir peticionamento eletrônico nem nenhum sistema de consulta digital, além de se tratar de um inventário litigioso, que geralmente leva anos até ser resolvido, eu precisei abandonar o caso”, afirmou o advogado. “Se fosse agora, certamente, teria sido mais fácil”, concluiu.

Excesso de demanda

Com a população baiana estimada em 14,8 milhões, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cada uma das 203 comarcas estaria disponível para atender 72.906 pessoas. De acordo com o último Justiça em Números, divulgado na terça-feira (28) pelo CNJ e referente aos dados de 2017, para comarcas de primeiro grau, o tempo médio de espera de uma sentença na Bahia é de quatro anos e nove meses.

A automatização do judiciário ainda depende do trabalho de servidores dos tribunais estaduais, como o atendimento do público nas Varas, o lançamento das movimentações processuais no sistema, entrega de intimação por oficial de justiça, além de outras atividades específicas de cada função. Cabe ressaltar que o último concurso de servidores do TJ-BA aconteceu em 2014 e foram nomeados 200 pessoas em abril deste ano.

O que diz a OAB-BA

Por meio de nota, a OAB da Bahia afirmou que “considera o fechamento de comarcas inconstitucional e contrário ao artigo 121 da Constituição do Estado da Bahia, que prevê que a cada município corresponderá uma comarca”. Ainda segundo a seccional baiana da Ordem, “antes de fechar qualquer unidade, é preciso fazer um projeto de reestruturação sustentável do Judiciário baiano”.

A autarquia baiana ainda destacou que, no ano passado, o Tribunal de Justiça da Bahia propôs a desativação de 100 comarcas, mas, após ação judicial movida pela própria OAB-BA, o número caiu para 33. “Trata-se de um processo sistemático de redução da prestação jurisdicional no estado da Bahia, com inegáveis prejuízos à garantia constitucional do acesso dos cidadãos à Justiça”, afirmou, em nota.

O Tribunal de Justiça da Bahia informou que não pode ir de encontro ao que determina o CNJ para a classificação de uma unidade judiciária e que, nos casos das desativações na Bahia, “é possível uma reversão desde que a comarca volte a obedecer os critérios estabelecidos no artigo 8º da Resolução nº 184 do órgão”.

A Corte baiana ainda ressaltou que, para o fechamento, são observados “critérios e questões técnicas, como a arrecadação judicial e a despesa da comarca, bem como a distância entre as comarcas que recepcionarão o acervo processual e o número de servidores da comarca desativada”.

Correio da Bahia

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