Os diferentes tamanhos da cauchaça. (Foto: Eliane Silva)

Em Ilhéus, cacau não é apenas a matéria-prima do chocolate comum ou do premium. O fruto que já representou 67% do PIB da Bahia de Jorge Amado acaba de virar cachaça e em breve deve se tornar perfume, fertilizante e até combustível. A “Cauchaça” foi lançada nesta semana pelo engenheiro agrônomo e produtor de cacau Marcelo Abrantes, no Chocolat Bahia 2018, o Festival Internacional do Chocolate e Cacau, que termina domingo (22/7) em Ilhéus.

Marcelo conta que iniciou os testes para a produção do brand em uma pequena destilaria instalada em sua fazenda, a Porto Esperança, há três anos, dentro da filosofia que norteia sua plantação em Ilhéus: extrair mais do cacau, ou seja, gerar mais renda tirando tudo que o cacau pode dar.

“Já tinha experiência com cana-de-açucar e meu pai produzia cachaça em Minas. Achei, então, que seria fácil produzir a cauchaça, mas cometi muitos erros no processo até chegar à formulação correta”, conta o agrônomo que também trabalhou para terceiros com produção de leite, mandioca, coco e outras culturas. A bebida, lançada em edição limitada a 60 garrafas de 750 ml, é produzida com a destilação do mel do cacau, extraído da polpa que envolve a amêndoa do cacau.

O investimento no desenvolvimento do brand passou de R$ 400 mil, segundo o produtor, que tem capacidade de produzir mil litros por ano, mas planeja expandir para 3.000 litros em quatro anos. Para produzir um litro de cachaça são necessários 20 litros de mel de cacau, extraídos de cerca de 900 frutos. A garrafa custa R$ 385,00.

Além do estande no festival, a Cauchaça já pode ser consumida em hoteis de Ilhéus e em breve deve chegar a outros pontos de venda no país. Os planos do produtor e da filha Marcela, formada nos EUA em comércio exterior, incluem a exportação da bebida.

A tecnificação da Fazenda Porto Esperança, que tem 100 hectares de cacau no sistema cabruca (cresce sob a sombra da mata) consorciado com seringueiras, começou em 2014.

Além do cacau commodity e da cauchaça, a fazenda produz nibs (sementes de cacau fermentadas, secas, torradas e trituradas, usadas na culinária), amêndoas caramelizadas e granola baiana “

Os investimentos incluem fertiirrigação, plantio de clones mais resistentes à vassoura-de-buxa, praga que dizimou as lavouras baiana no final da década de 80, e mecanização de alguns processos. A renovação já atingiu metade das plantas. A produtividade no ano passado, com estiagem, foi de pouco mais de 15 arrobas por hectare (média baiana), mas a meta da família Abrantes é chegar a 150 arrobas por hectare em três anos. “Isso é totalmente possível com o uso das novas técnicas”, diz Marcelo, que obteve financiamento para investimento e custeio no Banco do Nordeste.

Além da venda do cacau commodity e da fabricação de cauchaça, a Porto Esperança já produz e comercializa mel de cacau, nibs (sementes de cacau fermentadas, secas, torradas e trituradas que podem ser consumidas ao natural ou ser usadas na culinária), amêndoas caramelizadas e granola baiana (mistura de cacau, coco e rapadura).

Inovação

Da parceria entre a Universidade Estadual de Santa Cruz, de Ilhéus, e 13 empresas públicas e privadas nasceu em abril de 2017 o CIC (Centro de Inovação de Cacau), que aproxima os produtores de amêndoas de cacau de qualidade das fábricas de chocolate. O investimento foi de aproximadamente R$ 2,1 milhão, sendo R$ 1,8 milhão das empresas. Incubado na universidade que fica na rodovia Jorge Amado, em Ilhéus, o CIC tem como objetivo elevar o cacau do patamar de commodity para o de amêndoa premium, matéria-prima dos melhores chocolates produzidos no mundo.

“Queremos transformar a região por meio da valorização do cacau”, diz o biólogo Cristiano Vilea, diretor do CIC, lembrando que 83 municípios do sul da Bahia, entre eles Ilhéus, acabam de obter o selo de Indicação Geográfica de produção de cacau. Segundo ele, a mudança de patamar pode agregar até 140% de bônus ao produtor na venda da amêndoa no mercado, em relação ao preço pago pelo cacau commodity, avaliado atualmente em R$ 140 a arroba.

As amêndoas que chegam ao local são classificadas visualmente em tábuas por técnicos que analisam as cores e aspectos da amostra. O CIC está finalizando um software de imagem que vai tornar essa avaliação mais objetiva. A segunda análise é sensorial: provadores capacitados identificam os aromas e sabores de cada lote, assim como é feito com amostras de cafés especiais. Ao final, as amêndoas passam por análises fisico-químicas em laboratório que estabelecem os teores de acidez e adstringência, nível da fermentação, presença de contaminantes etc. Não é cobrada a análise da primeira amostra de cada produtor. As demais custam em média R$ 75. O cacauilcutor recebe ao final um laudo que poderá usar para exigir um bônus de qualidade na hora de vender seu produto para as fábricas de chocolate.

Também no espaço da universidade, o CIC está implantado uma uma planta-piloto de chocolate, que vai testar novas formulações e também capacitar pequenos e médios produtores para fabricar suas próprias marcas, a fim de agregar ainda mais valor ao cacau.

* A repórter do Globo Rural viajou a convite do Festival Internacional do Chocolate e Cacau

 

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